a paisagem na janela
sugere versos de amor.
PedrO M.
ARTE E CULTURA
Jesus venceu a morte no madeiro,
Mesmo calado o sofrer não foi em vão;
Ressurgiu como o sol na imensidão,
A brilhar sobre o mundo por inteiro.
Com Ele, a dor é leve travesseiro,
E a cruz, caminho firme de perdão.
É vida que se faz em comunhão,
Pão vivo, milagre caminheiro.
Com a Páscoa, a luzir nossa jornada,
A fé se acende, plena e renovada,
No olhar dos que creem no santo altar.
Por isso, abrace a vida com ternura,
Em Jesus a nutrir fiel postura
De que a vida há de vencer, sem recuar!
Pedro Monteiro
O folheto Chicó, o Menino das Cem Mentiras, publicado em 2009 pela editora Luzeiro, foi meu primeiro texto. Essa publicação foi a porta de entrada para dezenas de outras, vestidas de livros, livretos e folhetos de cordel. Tudo começou com esse primeiro passo na seara da literatura de cordel.
Além de incentivar essa publicação, o poeta e pesquisador Marco Haurélio também foi o responsável pela ilustração da capa, mantida na edição mais recente do folheto, agora sob a responsabilidade da Rouxinol do Rinaré Edições.
A seguir, compartilho algumas estrofes do texto.
Venho respeitosamente
Pedir a vossa atenção.
Falarei de um Coronel,
Um homem sem coração,
E da astúcia de um menino,
Como segue a narração:
O Coronel atendia
Por nome de Nicanor,
Era um sujeito perverso,
Sem afeto, sem amor,
Que vivia a oprimir
O povo trabalhador.
Aos berros, ele dizia,
Batendo forte no peito,
Que o desígnio da morte
Era, sim, seu maior feito,
E só quem ele queria
À vida tinha direito.
Do jovem ao ancião,
No chicote ele tratava,
E quando escutava um não
A sua ira aumentava,
Mesmo que fosse mulher,
Sem piedade açoitava.
Mas se todos têm seu dia,
O Coronel teve o dele.
Estando preocupado
Com um assunto que ele
Preferia não lembrar,
E assim não se sujar nele.
Buscando descontração
Mandou rodar a notícia,
Prometendo pagar bem
A quem mostrasse perícia
Para lhe contar lorotas
Sem assombro e sem malícia.
A notícia chegou logo
A um certo Zé Conrado,
Que do bruto Nicanor
Era mais um agregado,
E para o povo dali
Homem bastante estimado.
Era pai de sete filhos
Com sua mulher Filó:
Pedro, Raimundo, Maria,
Antonio, Bento e Jacó;
Mais o pequeno Francisco,
Conhecido por Chicó.
Certo dia, Zé Conrado,
Mesmo sem ter intenção
De afrontar o Coronel
Ou lhe fazer agressão,
Jogando conversa fora,
Criou uma confusão.
Disse: — Ao Coronel não vou,
Pois não me sinto obrigado,
Mas se ele quiser, que venha
Ouvir meu pronunciado:
Eu conto até cem mentiras
A qualquer interessado!
Um jagunço, ouvindo aquilo,
Correu com má intenção
De provocar desavença
Em quem é sem coração,
E levou ao Coronel
Como uma provocação.
O Nicanor deu um urro,
Estrebuchando na teia,
Dizendo: — Se não cumprir,
A coisa vai ficar feia,
Ou me conta cem mentiras
Ou perde o couro na peia!
Depois reuniu dez cabras,
Dos mais cruéis que ele tinha,
Gritando: — Isso é pra já
E não quero ouvir gracinha!
Vou mostrar a Zé Conrado
Como se anda na linha.
O Piauí tem história
Que nos instiga e fascina.
Falarei neste Cordel
Sobre uma grande heroína,
Mulher negra, escravizada,
Da região nordestina.
Foi da pia batismal,
Como Esperança Garcia,
Que se fez raio de luz
Nas trevas da tirania,
Pela destemida luta
Em prol de cidadania.
Fazenda dos Algodões,
Lugar onde ela nasceu,
Pertencer aos jesuítas
Foi este o destino seu;
Registro mais detalhado
Com o tempo se perdeu.
Era o século XVlll,
Quando se deu esse evento;
Cinquenta e um foi o ano
Que marcou seu nascimento,
Ficando o dia e o mês
Ausentes neste momento.
Também é desconhecida
A sua filiação
Pela precariedade
De fonte de informação,
Que possa ser confirmada —
Não há documentação.
Foi mãe aos dezesseis anos,
Decerto inexperiente,
Tendo o segundo e terceiro
Filhos no mesmo ambiente,
Depois deu à luz mais quatro
Em paragem diferente.
Junto aos padres jesuítas
Com quem ela foi criada,
A labuta era constante,
Mas bastante humanizada,
Por isso, teve a façanha
De ser alfabetizada.
Mesmo não tendo na época
Qualquer amparo legal,
Ensinar cativo a ler
Era um ato marginal,
Por ser uma mulher negra;
Um agravante penal.
Mas o destino compôs
Os traços da sua sina
Com altivez expressada
Desde os tempos de menina,
Hoje presença luzeira
Na condição feminina.
(...).
Buscando novos caminhos,
Por um engenhoso plano,
Dom José I fez
Um edito soberano
Que depôs os Jesuítas,
Apesar do grande dano.
Assim, Marquês de Pombal
Impôs seu ponto de vista,
No tocante à catequese,
Postura protagonista
Da Coroa Portuguesa
Com viés Iluminista.
Mesmo os Sacerdotes tendo
Um papel fundamental
Na Catequese e na Ordem
No Brasil colonial,
Inda assim, foram expulsos
Por capricho de Pombal.
Passaram-se oito anos
De intensa transformação:
Bens pertencentes aos padres
Com nova destinação,
A Corte é quem nomeava
O executor da gestão.
Esperança estava bem
No lugar que foi criada,
Na cozinha e na limpeza,
Sempre muito dedicada,
Além de cuidar dos filhos
Depois da sua jornada.
Convivendo em harmonia
Na casa do seu senhor
José Esteves Falcão,
Bom administrador
Do lugar que ela servia
Com dedicado labor.
Uma inesperada ação
De gestão reformulada,
Para a Fazenda Poções
Esperança foi levada,
Onde, impiedosamente,
Passou a ser maltratada.
No momento em que chegou,
Já percebeu que teria
Um clima de turbulência
Na pauta do dia a dia,
Mesmo sem pensar na soma
Do preço que pagaria.
Ela e duas companheiras
Viveram grande terror.
Capitão Vieira Couto,
Na condição de feitor,
Era um sujeito perverso
Do coração sem amor.
Nas garras deste tirano,
Por ser cativa e mulher,
Ele a tratava igualmente
Se fosse um traste qualquer;
Sempre bradava dizendo:
— É do jeito que eu quiser!
Os maus-tratos eram tantos,
Causando dor e tormento.
O maldito capitão
Ria do seu sofrimento.
Déspota juramentado,
Nem escutava argumento.
Esperança era assim mesmo,
Uma mulher instigante.
Quanto mais a conhecemos
Nos surpreende o bastante,
Tendo nos brindado aqui
Com este feito brilhante.
Nesta carta-petição,
Além de voz pioneira,
Sua determinação
Faz tremular a bandeira
Do Piauí, que é Brasil,
E berço desta guerreira.
A Carta:
“Eu sou uma escrava de Vossa Senhoria da administração do capitão Antônio Vieira do Couto, casada. Desde que o capitão lá foi administrar que me tirou da fazenda algodões, onde vivia com o meu marido, para ser cozinheira da sua casa, ainda nela passo muito mal. A primeira é que há grandes trovoadas de pancadas em um filho meu sendo uma criança que lhe fez extrair sangue pela boca, em mim não posso explicar que sou um colchão de pancadas, tanto que caí uma vez do sobrado abaixo peada; por misericórdia de Deus escapei. A segunda, estou eu e mais minhas parceiras por confessar há três anos. E uma criança minha e duas mais por batizar. Peço a Vossa Senhoria pelo amor de Deus ponha os olhos em mim, ordenando que eu diga ao procurador que mande para a fazenda de onde me tirou, para eu viver com meu marido e batizar minha filha”.
De V.S. ª. sua escrava, Esperança Garcia”.
*Notas: Gonçalo Lourenço Botelho de Castro - Governador da Capitania do Piauí.
Poções - Fazenda administrada pelo capitão Antônio Vieira do Couto, de onde Esperança Garcia fugiu.
Brilho da flor amarela, num cenário multicor, a paisagem na janela sugere versos de amor. PedrO M.